Arquivo do mês: maio 2009

>A TURMA DA FUZARCA

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Conforme eu lhes prometi ontem (confiram aqui) eis o vídeo que fiz no BODE CHEIROSO na quarta-feira, pouco antes de Vasco e Corinthians, no Maracanã.


Notem que há, como sempre (eis uma de minhas sinas), um palmeirense no caminho. E notem, mais, o grito bárbaro, redentor, do homem de camisa azul e barba grisalha no canto à esquerda, sentado à mesa. Notem que é um berro, apenas, um grunhido olímpico, e não se consegue compreender o que ele tenta gritar. Mas entende-se – eis a verdade – tudo.

Até.

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DIGRESSÕES

Fui anteontem, depois de um bom tempo, ao Maracanã. Fui ver Vasco e Corinthians pela Copa do Brasil. Estádio quase-lotado, mais de 70.000 presentes, e acabou que vi um bom jogo de futebol, 1 para o Corinthians, que abriu o placar, 1 para o Vasco.

Deixei de ir aos estádios para ver o Flamengo. A estúpida decisão que proíbe a venda de cerveja nos estádios (e agora, mais absurdamente, no entorno dos estádios) foi fundamental para que eu passasse a preferir, de longe, o jogo visto do buteco com cerveja sempre à minha frente, ou o limãozinho da casa, ou os dois ao mesmo tempo.

Anteontem fui, entretanto, porque jogava o Vasco, o Vasco de meu pai, o Vasco de meu querido amigo Aldir Blanc, o Vasco de uma de minhas afilhadas amadas, Milena Blanc, o Vasco de meu irmão do meio, o Fefê. Quis, eu, dar de presente a ele, Fefê, a oportunidade de ver o jogo de seu time com o conforto que meus 40 anos pedem e que ele merece (tenho a impressão de que ele não ia ao Maracanã há coisa de 3, 4 anos). Fomos de cadeira especial graças à benevolência do Mussa, que gentilmente acatou meu pedido e me emprestou suas cadeiras perpétuas.

Além do mais eu tenho, pelo Vasco da Gama, já lhes disse isso aqui, uma simpatia aguda. Escrevi ali: “Meu avô paterno, Oizer (…), também era vascaíno. Meu pai, repetindo, é vascaíno, assim como o Fefê. E eu sempre tive uma agudíssima inveja – meu irmão não me deixará mentir – do que eu chamo de cafonice vascaína. Sempre admirei a velha Dulce Rosalina e suas mil e quinhentas pulseiras, sempre admirei a portuguesada que gritava casaca! a cada vitória do Vasco, sempre admirei o Santana, massagista legendário do Vasco da Gama, e estou aqui escrevendo, escrevendo, e não consigo – tristíssima constatação – traduzir exatamente o que me faz admirar, olimpicamente, o Vasco da Gama e seus torcedores, e a ligação umbilical entre esses torcedores e o clube – relação que nada tem de artificial, ao contrário do que acontece com os clubes de massa que acabam conquistando torcedores por questões de modismo.”.

Pausa.

Relendo este texto – Sobre o Vasco da Gama – escrito em dezembro de 2007, descobri um troço curioso. Em 21 de julho de 2008, há quase um ano, comentou um anônimo que disse morar em Portugal, vejam:

“Carioca do Maracanã, Rua Santa Luiza, desterrado há 10 anos na Europa (agora em Lisboa), invejo aqueles que sentem pelo Vasco o que senti na minha infância, sofrendo a escutar no rádio os gols de Rondinelli, Zico, Zico, Zico… Sofria, mas amava o meu time. Os anos Eurico mataram, para mim, a identidade do Vasco. Espero que haja ressureição.”

Ora, ora, ora… só pode ser o Sérgio Reis, de Lisboa, vejam aqui!!!!! Eu já disse e repito. Pra quem tem um blog uma das coisas mais bacanas é reler os comentários dos leitores… descobre-se cada coisa que eu vou lhes contar! Vamos voltar.

Notem como serpenteio hoje, razão pela qual o título, Digressões, parece-me perfeito.

Pois concentramo-nos, eu e meu irmão do meio, no Bode Cheiroso. Havia, ali, naquele buteco da General Canabarro, ainda comandado pela Martha (ponho o “h” no nome pois acho que fica mais bonito assim), uma legião de vascaínos de todas as gerações. Parêntesis: havia também um palmeirense que eu filmei, evidentemente, e amanhã mostro a vocês.

Cafonas toda a vida – eis uma característica vascainíssima -, velhos e moços cantavam hinos de guerra e tinham nos olhos a dor do recente rebaixamento e a esperança da glória, do reerguimento, da volta por cima.

Às nove e quinze tomamos o rumo do estádio, eu e meu irmão. Não íamos juntos ao estádio há muito tempo (escrevi lentamente a frase e não houve jeito de lembrar quando foi a última vez).

Como sou Flamengo o jogo tinha, para mim, a delícia da imparcialidade. Eu era, na mais absoluta acepção da palavra, apenas espectador. E assisti não apenas ao jogo, mas também ao meu irmão.

Ele, nervoso, cuspia palavrões como quem respira. E – vocês sabem disso – o palavrão, no estádio de futebol, tem a pureza de choro de recém-nascido. Meu irmão dava socos no ar, no encosto da cadeira da frente, e vê-lo nervoso, com raiva, com ódio da inabilidade dos jogadores vascaínos, me dava um prazer estranhíssimo. Assim como o palavrão, no estádio de futebol, é sacrossanto, o ódio é santo e purifica. Toda ira, no estádio de futebol, é santa.

E como eu estava em débito comigo mesmo com relação a alguns sentimentos que foram atropelados (não lhes interessa por quem), mesmo com os 90 minutos tendo passado rápido demais, fiquei, apesar da fugacidade do tempo de jogo, com a alma lavada.

Vê-lo ali (falo do meu irmão, por óbvio), espumando de ódio (santo, quero repetir), puto dentro das calças com o empate que deixou o Vasco em situação desconfortável para o jogo da próxima quarta-feira no Pacaembu, e ainda agredindo de forma irascível uma artistinha que era entrevistada na saída do jogo por um repórter da TV Globo, deixou-me profundamente satisfeito e com ainda mais saudade de uma porção de troços que pensei enterrados para sempre.

Andávamos em direção à escada rolante quando o vi apontando o indicador em direção à mulher:

– Piranha! Corinthiana safada! Piranha!

E as vozes eram muitas, a pobrezinha parecida assustada.

Cutuquei meu irmão:

– Quem é?

Antes que ele me respondesse, já explodindo de rir, virou-se um vascaíno de camiseta e tamanco à nossa frente:

– Uma corinthiana filha da puta sendo entrevistada por esse repórter de merda que tem o escudo do Flamengo tatuado no braço!

E espumava, ele também, de ódio santo.

Eu, curiosíssimo:

– Mas quem é? Qual o nome dela?

E o homem de tamancos:

– Sei lá, meu irmão! Nunca vi!

Eu, quase-médium, via aquele mar de cabeças cobertas por halos dourados que transformavam o Maracanã num pedaço do céu.

Até.

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UMA NOITE TIJUCANA

Perdão, minha mãe, mas preciso começar assim… Meus poucos mas fiéis leitores, vocês que me lêem sabem que desde há muito deixei de lado a faceta do Buteco que expunha, de forma aguda, minha vida pessoal e meu dia-a-dia, por incontáveis razões que não vêm ao caso. Ocorre que preciso lhes contar sobre a noite de ontem por conta não apenas da excepcionalidade do ocorrido mas também por conta da belezura que foi o desfecho da história, já quase quatro da manhã.

Tudo o que se viveu na noite de ontem ficará para sempre guardado na memória e no coração dos que estiveram em torno da mesma mesa no Bode Cheiroso, glorioso pé-sujo na rua General Canabarro, na Tijuca (é claro), desde às sete e meia da noite.

O que quero lhes contar aqui é outro troço.

O Cláudio, autor do blog Chuta que é macumba (aqui), e que é um triplo explosivo ambulante (ele é, em ordem alfabética, comunista, corinthiano e japonês), responsável direto pela realização do desejo agudo que tomou de assalto meu mano paulista, o homem da barba amazônica, veio ao Rio para ver Vasco e Corinthians.

Na bagagem, despachada noutro vôo, em carne e osso, isso mesmo, Fernando Szegeri, que veio – tomem nota – apenas para beber comigo (eu ia escrever conosco, mas eu sou assim).

Após o jogo, conforme o combinado, reencontramo-nos todos no Bode Cheiroso, já que além do Cláudio, também fui ao jogo, com o Fefê, meu irmão do meio. No buteco ficaram (em ordem alfabética para não ferir suscetibilidades) Felipinho Cereal, Fernando Szegeri, Luiz Antonio Simas e Marcelo Vidal.

Pois o Cláudio, quando descia a rampa das arquibancadas, disse a seus amigos corinthianos:

– Vamos comigo beber com uns amigos num buteco aqui perto?

Os civilizados membros da Gaviões da Fiel, homens mansos e desacostumados com as quebradas, fizeram “ohs” e “ahs”.

– Aqui perto?! Na Tijuca?!

– Na Tijuca.

– ´cê tá doido, meu! A Tijuca é foda. A Tijuca é violenta. A Tijuca é perigosa.

E ficaram nessa lenga-lenga nojenta que macula o bairro onde nasci, onde cresci e fui criado.

O Cláudio, que apesar dos olhos puxados enxerga longe, e que de otário não tem nada, foi ter conosco em torno da mesa.

E faço a ele o pedido público para que comente, ele mesmo, sobre o que foi o passeio que fizemos a pé (acompanhem o traçado em vermelho no mapa abaixo), da General Canabarro, de onde partimos quase às duas da manhã, em direção ao Estudantil, na Haddock Lobo. Saímos da General Canabarro, entramos na Oto de Alencar, descemos a Lúcio de Mendonça (onde mora o Simas), dobramos à esquerda na Mariz e Barros, à direita na Professor Gabizo, atravessamos a Heitor Beltrão, pegamos a Martins Pena, a Afonso Pena à direita, atravessamos a Doutor Satamini e entramos à esquerda na Haddock Lobo.

caminhada da rua General Canabarro até a rua Haddock Lobo, Tijuca, Rio de Janeiro

Pegamos o Estudantil fechado (perto das três da manhã!), mas vazava luz pela fresta da porta de ferro.

O Felipinho bateu:

– Quem é?

– Felipinho, amigo do Edu…

Abriu-se a porta.

– Pô, por que tu não disse logo que era você?! O que vocês querem?

– Três cervejas e quatro copos americanos… toma aqui o dinheiro…

Éramos, àquela altura, eu, Cláudio, Felipinho Cereal e Fernando Szegeri.

– Paga depois… paga depois…

Nos entregaram as três cervejas geladíssimas já abertas, os quatro copos, e o caboclo disse, já indo embora:

– Depois deixa no canteiro ali, ó, os cascos e os copos. Falou?

E disse o homem da barba amazônica, de olhos marejados, uma de suas frases clássicas:

– Sabe quando isso aconteceria em São Paulo?! NUNCA! – e fez-se o eco na deserta Haddock Lobo.

Generosas doses de Old Parr fecharam a noite, quando me despedi do malandro às cinco e meia da manhã.

Salve a Tijuca e – o Cláudio vai lhes contar… – suas ruas!

Até.

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MAIS SOBRE SANTA

Preciso confessar a vocês, de pé diante do balcão imaginário, que me empolguei com a repercussão de meu humílimo texto no qual discorro, brevemente, sobre o comportamento de grande parte das pessoas que sobem para o aprazível bairro de Santa Teresa, que elas chamam de Santa, com uma intimidade tão falsa quanto o comportamento a que me referi (e ao qual novamente me referirei hoje, leiam aqui). Luiz Antonio Simas  fez menção ao texto em seu Histórias do Brasil (aqui) e Carlos Andreazza, em seu Tribuneiros (aqui). Recebi alguns e-mails elogiando o que escrevi, e um comentário – apenas um – que não publiquei por ser anônimo ( enquanto lia as agressões do descolado a telinha do computador exalava um repugnante cheiro de maconha e de pele mal lavada).

E do que me acusava o ser humano que enviou tal comentário sob o manto do anonimato?

Sentem-se, meus poucos mas fiéis leitores, que a acusação do bicho-grilo é gravíssima.

Pausa: tomei um pito de mamãe, dia desses. Disse-me ela, por e-mail (recebo e-mails de mamãe com freqüência), que este chavão – meus poucos mas fiéis leitores – é “às vezes cansativo para quem lê sempre”. Em frente.

Acusou-me de ser bairrista.

Eu?

Ora, pobre do homem que não é bairrista. Pobre do homem que não nutre, pelo chão no qual nasceu, cresceu e no qual vive, um amor fanático, cego, retumbante e patriótico. Vejam vocês o caso de Arthur Tirone, o Favela. O caboclo escreveu dia desses: “Sou, e quem me conhece sabe, um sujeito fincado neste brejo.”. Referia-se, é claro, à Barra Funda, e esse amor do Favela por seu chão nos torna ainda mais próximos, jungidos pelo amor sagrado que nos une à nossa terra. Vejam vocês o caso de Luiz Antonio Simas, que tem pregado por onde anda sua decisão, inamovível, de não deixar os limites da Tijuca para nada que não seja estritamente indispensável. Leiam o Felipinho Cereal, aqui, e me digam se esse troço de amor pelo bairro não é bonito pacas. Ora, meus poucos mas fiéis leitores (desculpe, mamãe), percebam que o piolhento que me agrediu através do comentário não publicado foi infeliz, como deve ser infeliz, ele próprio, morando no Leblon, onde disse viver desde que nasceu. Escreveu, à certa altura, o fedorento: “Nasci e até hoje vivo no Leblon. Mas não dispenso a feijuca do Bar do Mineiro nos finais de semana. Não dispenso a carne-de-sol do Bar do Arnaudo. Não dispenso o clima do Sobrenatural com suas cervas geladaças. Não dispenso o cineminha no Cine Santa. E tenho dinheiro para tudo isso, o que não deve ser seu caso.”.

Vejam os clichês pipocando no texto. A “feijuca” (eles são íntimos de tudo) do Bar do Mineiro (que é apenas razoável). A carne-de-sol do Bar do Arnaudo (que não faz nem cócegas na que é servida no Bar do Chico pela metade do preço). A “cerva geladaça” do Sobrenatural, o “cineminha no Cine Santa”.

Encaixa-se, com perfeição de puzzle, na descrição que fiz do jovem que sai da zona sul em direção ao Largo da Carioca em busca do bondinho que o levará para Santa Teresa.

Posso apostar minhas fichas como o cheio-de-lêndeas estuda na PUC (onde estudei Direito e onde vivi à margem dos descolados que me rejeitavam como um pestilento). Permitam-me lhes contar um troço, rápido. Primeiro dia de aula, ano de 1987. Fui para o campus de chinelo de dedo (o que me garantiu o apelido de “pedreiro” nos primeiros meses), bermuda, camisa de malha, uma mochila, um caderno, caneta, lapiseira e borracha. Os homens de minha turma, todos, de terno.

Já trabalhando?, eu me perguntei.

Não. Era pose. Pose, pose e apenas pose.

Pois então. O cheio-de-lêndeas estuda na PUC, planeja suas incursões à Santa Teresa (que ele chama de Santa, como sói acontecer) apertando um na vilinha dos Diretórios Acadêmicos da Universidade, vai aos lugares-clichês que fazem a festa da Veja Rio, é eleitor empedernido do PSOL (que é, como bem disse o Simas, Santa Teresa em forma de partido político) e tem a pachorra de perder seu tempo para me chamar de bairrista, como se isso fosse uma forma de agressão.

Deus permita que eu me mantenha assim, tijucano até o último de meus dias, e por várias encarnações.

Até.

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O BUTECO EM LISBOA

Dia desses eu publiquei O Buteco em Copenhagen (leiam aqui), transcrevendo o e-mail que recebera de uma leitora brasileira residente na Dinamarca.

Domingo passado, assim que cheguei de São Paulo, dei de cara com o e-mail que abaixo transcrevo, de autoria de Sérgio Reis, brasileiro (tijucano, tijucano, tijucano!!!!!) hoje residindo em Lisboa, Portugal.

Comecei a lê-lo em voz alta pra minha menina. E a voz começou a embargar. O emocionado relato do meu chapa tijucano é só mais uma prova (definitiva) de que o sujeito pode sair da Tijuca. O bairro – é uma verdade acachapante – jamais sairá de dentro do sujeito.

“Caro Eduardo,

Nasci no Maracanã, ali na rua Dona Luísa (aquela que, com a Dona Zulmira, se fez famosa pelas batalhas de confete dos anos vinte do – vá lá – século passado). O ano era 1968 (boa safra). A vida depois me levou a outros cantos: estive alguns anos em Botafogo, depois fui para Minas Gerais. Mais tarde, um pouquinho mais longe: Barcelona, Valencia e agora, definitivamente (como dizem, esta palavra vale o que vale ‘permanente’ como penteado feminino), Lisboa.

Demorei muito (muitos anos, mesmo) a perceber a marca que meus primeiros anos de Tijuca e arredores havia deixado na minha alma, no modo de ser, gostos, preferências, identificações e afinidades. Passei tempo a me perguntar porque buscava e gostava tanto de um determinado tipo de ambiente, música e histórias. Por exemplo, que diabo me enlouquecia tanto em tudo que o Aldir Blanc fazia (para piorar, meu pai é de Ponte Nova, terra do João Bosco), que ‘estranho fascínio’ exercia em mim tudo que dizia respeito às histórias da Tijuca, os butiquins, bem, penso que me explico.

Curioso como possa parecer, algo que realmente me fez fechar a questão foi, já ‘velho’, o encontro do teu blog (fará um ano). Comecei a ler estas coisas tuas, do teu amigo Simas e me invadiu uma sensação tão estranha, de, de repente, não sei, ter visto diante de mim o meu berço, o que teria sido a minha vida sem tanta andança, e mais, o porquê da minha atração por todos estes aspectos, atração que sempre me acompanhou mas, talvez estupidamente, nunca me pareceu óbvia.

Desde então, desnecessário dizer, a frequência com que sigo as histórias destes blogs até já irrita (só um pouquinho) a minha mulher. É troço para Freud explicar, ou talvez não seja tão difícil: sinto-me tão bem, aconchegado, como que visitando a casa dos primos, quando leio o que os dois escrevem (não preciso nem concordar com tudo, coisa que, naturalmente, não acontece). É-me sempre prazeroso ler as postagens, tanta picardia, ternura/ira (na dose certa), tanta sinceridade, de gente que tem a mesma bagagem que eu.

Bem, era só isso. Pensei que gostaria de saber que ajudaste no resgate do background (o anglicismo é só para provocar) de um tijucano que anda longe há décadas.

Obrigado e um abraço,

Sérgio”

Daqui, do Brasil, sob esse céu azul-de-maio que desenha-se no Rio de Janeiro nesse começo de manhã, mando um abraço do tamanho da Tijuca pro Sérgio.

Até.

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>OS TIRONE

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Do alto dos meus 40 anos posso dizer, sem medo do erro, que a vida me pregou muitas peças. Apresentou-se doce e mansa por vezes e noutras tantas amarga e tormentosa. Tive muita tristeza e muita decepção mas também intensas alegrias e incontáveis surpresas. Cultivei um poço artesiano de ternura e encontrei lodo e lama no fundo. Fui irmão dos meus irmãos e houve quem dissesse que jamais o fui. Por outro lado a terra, arada permanentemente por minhas mãos ávidas por coisa boa, mostrou-se fértil. Posso dizer, por mais que eu tenha a alma machucada por estar vivo (o que se diz imaculado é um mentiroso), que sou um homem de sorte. Vim de uma família da qual me orgulho, nasci e cresci num bairro que amo, tenho os amigos que quero e dos quais preciso, vivo com a mulher que amo, e amealhei, e venho amealhando, e que os deuses permitam seja assim pra sempre, fraternos amigos que dão mais sentido a essa aventura fabulosa que é viver.

Vocês estão carecas de saber que Fernando José Szegeri (e escrevo seu nome todo a pedido do próprio) é um sujeito fundamental pra mim. Dentre tantos feitos capazes de me tornar um homem melhor, Fernando José Szegeri foi o autor de um que serve como mote para o que quero lhes contar hoje.

Fernando José Szegeri apresentou-me a Arthur Tirone, o Favela. Foi no CUCA, em São Paulo, durante um dos aniversários da AGENDA DO SAMBA & CHORO (não consigo me lembrar em que ano, nem à fórceps). Fomos costurando, eu e o Favela, ao longo do tempo, uma relação sólida que a mim só trouxe coisa boa, amalgamada à base de cerveja, cotovelos no balcão, limão da casa, doses de Cynar, porções de torresmo e muito samba. Relação iniciada, é preciso que se diga, com o aval que foi dado pelo homem da barba amazônica. Esse troço do aval, entre os homens, é de suma importância. Não por outra razão formamos um time de primeira, hoje em dia: não é nada incomum estarmos à mesma mesa eu, Arthur Favela Tirone, Bruno Ribeiro, Felipinho Cereal, Fernando Szegeri, José Sergio Rocha, Luiz Antonio Simas, tantos outros (todos em ordem alfabética para não ferir suscetibilidades), e sempre sob as bençãos desse filho de Xangô, homem bom e justo a quem fui visitar neste último final de semana, mais uma vez (fui tomar-lhe a benção, eis a verdade).

Fui visitá-lo e ele havia programado um furdunço no sábado.

Na sexta-feira, pouco antes de sair do Rio, recebi o chamado szegeriano. Disse-me ele:

– O Favela também vem!

E disse mais:

– O Bruno também!

Nem bem eu festejava a notícia e ele emendou:

– Mimi e Denize também, Edu! Você vai conhecer o Mimi!

O Felipinho Cereal, que recentemente teve o prazer de conhecer Vladimir Tirone, o legendário Mimi, (leiam aqui o relato do Felipinho e aqui dois relatos de seu próprio filho), já havia me dito:

– Você precisa conhecer o Mimi, uma lenda viva, uma lenda!

Pequena pausa.

O Favela nutre, pelo pai, um amor e uma devoção que muito se assemelha ao amor e à devoção que nutro por meu pai. Como nutre, pela Barra Funda, um amor assemelhado ao amor que me liga, umbilicalmente, à Tijuca. E seus olhos, quando miram a mulher amada, têm o mesmo brilho que embeleza meus olhos feios quando eles encontram os luminosos olhos da mulher que me ensinou a sorrir. São pequenos exemplos, pequenos sinais que nos fazem irmãos das mesmas crenças e da mesma fé.

Pois conhecer Vladimir Tirone e Denize (a menina do Mimi), beber com eles todos (eram três varões Tirone sob o mesmo teto), beber com José Szegeri, e eu com uma aguda saudade de meu pai, que fez forfait e não apareceu, foi mais um grande prêmio que a vida me deu.

Osvaldo Tirone (leiam aqui um emocionado relato do neto) pintou na área, depois de devidamente evocado. E pensando bem, meus poucos mas fiéis leitores, papai também bebeu conosco.

José Szegeri, Eduardo Goldenberg, Vladimir Tirone, Fernando Szegeri, Bruno Tirone e Arthur Tirone, 23 de maio de 2009, São Paulo
Bruno Tirone, Vladimir Tirone, Marcão Gramegna, Arthur Tirone e José Szegeri, 23 de maio de 2009, São Paulo

Dona Denize, antes de ir embora, já tarde da noite, ela que fez o papel de mãe-de-todos-nós, me disse uns troços tão bonitos, mas tão bonitos – e não há razão para reproduzir suas palavras aqui – que cravou-se em mim a certeza de que a Barra Funda e a Tijuca são co-irmãs, que os Goldenberg, os Szegeri e os Tirone (na mesmíssima alfabética ordem de alhures) são frutos do mesmo barro, do mesmo sagrado barro moldado pelas mãos de nossos antepassados que gargalhavam sobre as árvores daquela casa abençoada no bairro da Lapa, distrito da região oeste da cada vez mais sagrada cidade de São Paulo.

Até.

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CLARO QUE NÃO PRESTA

Quando o Brasil foi varrido pela onda da privatização, iniciativa da tucanalhada que distribuiu aos amigos o tesouro nacional, a patuléia comemorou. Diziam, bem me lembro, que estávamos ingressando no primeiro mundo, que estávamos deixando pra trás o estatismo jurássico em nome de um empuxo em direção ao futuro modernoso, eficiente e capaz de dar conforto e qualidade aos brasileiros. Diziam, mais, como repetidores autômatos do discurso mentiroso que encobria as falcatruas que enriqueciam os poderosos de sempre, que a competitividade do mercado aberto à iniciativa privada seria saudável e assim vimos os grupelhos formados por ladravazes vorazes (a rima foi de propósito sem nenhum propósito específico) tomando de assalto a telefonia, a energia, e tudo mais.

Sou cliente da CLARO, operadora de telefonia celular que detém grande fatia do mercado brasileiro.

Na semana retrasada, intrigado com umas cobranças equivocadas feitas na minha conta mensal, tentei contato com o 1052, o telefone disponibilizado pela (des)operadora para atendimento aos clientes.

Depois de uma semana inteira sem conseguir contato com o telefone-mentira (como mentirosas foram as premissas que balizaram a vergonhosa entrega do sistema nacional de telefonia), decidi filmar a patética situação. Vejam o filme abaixo.

A portabilidade – o nome é nojento mas o troço é interessante do ponto de vista do consumidor insatisfeito – está aí pra isso mesmo.

É claro que vou rescindir meu contrato com esse lixo que atende pelo nome CLARO.

Até.

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CENAS TIJUCANAS

Já vi de tudo – ou quase tudo – aqui na Tijuca, de longe o melhor bairro da cidade. Vira-e-mexe alguém me pergunta sobre a Tijuca, sobre esse profundo amor que nutro pelo chão desse bairro que me viu nascer e crescer, quase sempre sem entender o que há na Tijuca e que seja capaz de tanto me magnetizar. Não cabe explicação, diria o poeta. Mas eu me atrevo a, numa brevíssima digressão, explicar a você, leitor de longe (alô Daniel, alô Camila!), o que é que há aqui nesse bairro onde nasceu Tom Jobim, onde vive o estupendo compositor Aldir Blanc e os imprescindíveis Felipinho Cereal e Luiz Antonio Simas, onde fica o morro da Formiga, do Borel e do Salgueiro, bairro vizinho do Estácio e de Vila Isabel, onde fica o Maracanã, o América, a Praça Afonso Pena, grandes botequins, quitandas antiquíssimas, ruas portentosas como a Matoso, a Conde de Bonfim, a São Francisco Xavier que passa pela Mangueira, onde vivem meus pais desde que nasceram, onde viveu o poeta Paulo Emílio da Costa Leite, onde fica a secular igreja de São Francisco Xavier do Engenho Velho, bairro mágico que só se desvenda ao homem com olhos de ver e ouvidos de ouvir.

Hoje mesmo, voltando pra casa (voltando à primeira frase deste texto), tropecei numa macumba na esquina da Caruso com a Haddock Lobo que eu vou lhes contar! A assistência que bebia de pé, diante do balcão do Bar do Marreco, tecia os mais estapafúrdios comentários sobre o troço. Despachado na esquina, um prato de barro gigantesco, comidas que não identifiquei, quatro velas acesas em volta da coisa, uma garrafa de marafo e, deitada sobre um leito de farofa amarela, uma boneca horrorosa e desfigurada (tinha os olhos arrancados e portanto vazados) que me pareceu a Barbie (sem negrito, evidentemente, que boneca não é gente), com os cabelos desgrenhados e sem uma das pernas.

Um cabeça branca (parei pra ouvir a discussão) deu a sentença:

– Deve ter sido o Pinóquio…

– O Pinóquio? – disse um careca barrigudo sem camisa.

– O Pinóquio… – e cofiou a barba, o coroa.

Deu um gole na cerveja, tragou fundo o filtro amarelo que pendia da boca, e arrematou:

– Dizem que o filho dele, o…, o…

– O Maurício! – foi a ajuda que deu o balofo.

– Isso! O Mauricinho… – e riu.

– O que é que tem a bichinha? – emendou o Marreco, de dentro do balcão.

– Pois é, dizem que o moleque pediu uma boneca Barbie de presente de aniversário pro pobre do Pinóquio!

Neguinho explodiu de rir na esquina.

Continuou:

– Parece que ele foi se consultar com a dona Catarina, aquela macumbeira lá da Praça da Bandeira, que recomendou expressamente esse troço aí.

Apertei o passo pra casa.

Fiquei rindo de mais essa cena, tijucaníssima, e agradeci a Deus o fato de ter nascido aqui, de ter escolhido viver aqui. Em nenhum outro lugar há mais autenticidade. Lembrei-me de Santa Teresa, por exemplo. O aprazível bairro tem um troço que me intriga. Ele modifica as pessoas de uma forma aguda, ele molda as pessoas, ele dita moda e a moda é incorpoada pelo visitante, como se este último fosse um médium sem controle sobre a entidade. Explico.

O casalzinho jovem mora em Ipanema e resolve ir à Santa Teresa no sábado pela manhã. Tomam um táxi e saltam no Largo da Carioca a fim de tomarem o bonde pra Santa (o habituè adora chamar Santa Teresa de Santa). Entram no bonde. O bonde parte. Atravessa os Arcos da Lapa e na primeira curva, já dentro do bairro, começa o espetáculo. Ela abre a mochila. Saca uma touquinha de crochê, tira o All Star e veste uma sandália de couro, coloca uma bata colorida sobre a camisa de malha, põe uns 6, 7 anéis nos dedos da mão, estende o anel de osso preto pro namorado, que o atarraca no polegar da mão direita. Ele rasga a bermuda jeans, como um possesso. Joga o par de tênis dentro da mochila da namorada, veste um par de havaianas surradas, despenteia o cabelo, coça a cabeça como um menino cheio de lêndeas e saca do bolso da frente o cigarrinho de maconha piscando o olho em direção à namorada:

– Máum? – é assim que essa gente fala “vamos fumar um?”.

E passam a tarde felizes zanzando pelas ruas do bairro alternativo.

Semelhante fenômeno – o da transformação, o da mimetização entre bairro e visitante – dá-se com a Lapa.

A Lapa de outrora, que eu não conheci, era muito, muito, mas muito diferente dessa mentira que contam hoje. Ontem à noite mesmo, de papo com um amigo querido da velha-guarda, disse-me ele, revoltado com essa Lapa bacana que toda hora é manchete dos caderninhos de cultura dos jornalecos cariocas:

– Ninguém mais pega gonorréia na Lapa, porra!

Pausa: esse sujeito, esse grande sujeito, será o próximo entrevistado do Buteco, aguardem.

Vejam vocês que dia desses a revistinha das sextas-feiras do lastimável jornal O Globo pôs na capa o sexagenário Caetano Veloso posando dentro do Capela (onde, suponho, ele jamais pisou), dizendo que a Lapa é a síntese do Rio.

Mentira.

A síntese do Rio – já disse Luiz Antonio Simas em brilhante entrevista que tenho gravada – está na zona norte, no subúrbio, nas biroscas da Baixada Fluminense, no coração do carioca que não está nem aí pra modas, modismos e mais que tais.

Vai-se à Lapa hoje e deixa-se as calças pra pagar as despesas cobradas naquelas mentiras que pululam a cada esquina.

E o que faz a playboyzada que vai beber na Lapa nos finais de semana?

Sai de lá com uma malemolência fabricada e mal feita dizendo:

– Brother, a Lapa é demais, mermão. Demais.

Não sabem nada.

Até.

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>SZEGERI E O BRIZOLA

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Como lhes contei aqui, no texto BRIZOLA EM 1989, muito por alto, Fernando José Szegeri, esse mito, o homem da barba amazônica, esse homem que já nasceu barbado e já funcionário público, esse pai de três filhos, arrimo de família, meu irmão siamês, esse homem incapaz de rejeitar, a qualquer tempo, a condição de siamês que nos torna capazes de momentos que beiram o inacreditável (e os exemplos são muitos, as testemunhas também), em 1989, com – o quê? – 17, 18 anos de idade, estava certo de que seu primeiro voto para Presidente da República seria em Mário Covas. Foi assistir ao último debate entre os então candidatos ao cargo, ouvir o emocionado pronunciamento final de Leonel Brizola e mudou o voto. Foi o que lhes contei, quase secamente.

Ontem pela manhã, aturdido com a possibilidade do engano, do equívoco, do deslize biográfico, chamei-o pelo rádio a caminho do trabalho.

Não sei se já lhes contei… Já. Seguramente já. Compramos, eu e o Szegeri, ao mesmíssimo tempo, aparelhos NEXTEL com o intuito de reduzir, drasticamente, nossas despesas com telefonemas diários e intermináveis. Hoje, graças à tecnologia NEXTEL, levamos no bolso a mesinha do bar, o balcão, a cerveja e os copos, e um aperto do botãozinho nos permite diálogos sem o peso do interurbano.

Pois eu o chamei hoje cedo.

Contei-lhe sobre o texto. E sobre a versão que tornei pública.

Ele, empolgado, com a voz embargada lembrando do discurso do velho caudilho, foi enfático:

– Edu… Edu… preciso do início ao fim! Preciso!

Eu, aliviado:

– Verdade?

– Juro.

Fernando Szegeri, um homem que poderia dispensar qualquer jura, eis que não mente, rebaixou-se à condição de um homem qualquer e eu pude ouvir o estalinho dos beijos dados nos indicadores junto à boca durante a confissão:

– Juro, querido! Foi isso mesmo. Mas foi mais dramático…

– Foi? Conta, conta, conta!

– Eu trabalhei, como um mouro, por mais de seis meses, na campanha do Mário Covas. Assisti, como quem assiste a uma final de Copa do Mundo, ao debate final. Quando o Brizola terminou esse discurso, Edu…

Ouvi o homem da barba amazônica fungando. E sem tirar o dedo do botãozinho, não permitindo qualquer intervenção minha.

O motorista do táxi que me levava, sem entender a razão pela qual eu também chorava ouvindo o relato szegeriano, a tudo acompanhava, visivelmente interessado.

Ele continuou:

– … eu estava sozinho no sofá da sala, e lembro-me bem que estava bebendo um Ovomaltine quente preparado pela minha mãe, àquela altura no banheiro, tomando banho…

Ele não soltava o botãozinho, e eu podia ouvir seus soluços.

– … quando o Brizola terminou de falar eu chorava violentamente e fui até a porta do banheiro de minha mãe… bati vigorosamente na porta e ela gritou assustada perguntando o que havia acontecido… e eu só consegui dizer, grunhindo… mãe… eu vou votar no Brizola! E votei, querido. Votei no Brizola. Você foi preciso!

Tenho certeza, meus poucos mas fiéis leitores, de que ainda mais preciso depois desse relato.

Até.

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>LUÍS ROBERTO, UMA VERGONHA

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Acaba de terminar a rodada de três jogos pelas quartas-de-final da Copa do Brasil (o Coritiba garantiu, ontem, sua vaga). O Vasco, time de meu pai, de meu querido amigo Aldir Blanc, de minha amada afilhada Milena, de minha comadre Mariana, empatou com o Vitória e garantiu vaga nas semi-finais do torneio. Nada mal para um time que está na Segunda Divisão do Campeonato Brasileiro. O Fluminense, time do maior dentista do Brasil, Marcelo Vidal, e de Marcelo Moutinho, empatou com o Corinthians de meu irmãozinho Arthur Tirone, o Favela e de Julio Vellozo (o mais recente blogueiro dentre os meus, vejam aqui o CASAGRANDE FUTEBOL CLUBE), e deixou escapar a vaga no Maracanã. Já o Flamengo, o meu Flamengo, perdeu de 2 a 1 para o Internacional no Beira-Rio e também abandonou a competição.

Mais nojento que constatar a lamentável situação do time rubro-negro (que mereceu a eliminação) foi assitir à partida narrada por esse locutor da TV GLOBO (podre, como sempre) chamado Luís Roberto, torcendo vergonhosamente pelo time gaúcho.

Uma vergonha, um lixo – um coerência, no final das contas.

Até.

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