Eis que vem chegando ao fim o ano de 2011, o ano mais marcante de toda minha vida. O ano em que o nove de julho foi um divisor profundo de águas, na medida em que foi nesse dia que minha menina, a mulher que me ensinou a sorrir, desapareceu pra sempre, como lhes contei, dolorosamente, na madrugada mais triste de meus pouco mais de 42 anos, aqui.
Quando escrevi o último texto do ano de 2010, Final de ano, aqui, desejei a todos um ano-manguaça (leiam o texto indicado pra que vocês entendam ano-manguaça) e registrei o seguinte:
“2010 não foi, como não tem sido a vida, um ano tranqüilo. A situação que enfrento intramuros é capaz de estabelecer um permanente desafio que – é como penso – exige de mim a exata medida entre o medo e a esperança, entre a angústia e o ânimo, entre o ateísmo e a fé, entre o branco e o preto, entre o fogo e a tempestade, entre a baunilha e o sal. Mais que nunca, e tem sido assim a cada dia que passo, valho-me da lição de um de meus mestres e a cada tristeza ergo o meu copo ao humor – essa é a grandeza que o samba me ensinou.”
Eis que 2011 não foi, também, um ano tranqüilo. Tive um Carnaval absolutamente atípico por conta do estado de saúde da Dani – leiam Carnaval – Exortação à morte por 3 dias, aqui. Enfrentei, poucas semanas depois, o primeiro sete de abril sem minha avó – leiam Vovó faz anos amanhã, aqui. No dia 18 de maio, o que me foi profundamente doído, fui obrigado, por amor, a expôr pela primeira vez, de forma direta e sem qualquer pudor, aqui no blog, a fragilidade de minha menina, que naquele momento necessitava urgentemente de sangue por conta de debilidades físicas que já me apontavam para o pior – leiam Carta aberta aos meus, aqui, com 134 comentários até o momento, demonstrando o quanto de carinho me (nos) cercava o tempo todo, tendo sido absolutamente exitosa a campanha pela doação. Até que veio julho e com ele o pior, pelo qual eu já temia: eu perdi minha menina e me vi, de uma hora pra outra, só, absolutamente só, sem saber fazer rigorosamente nada sozinho, tendo sido obrigado (o que faço até agora, com a tenacidade de uma criança) a começar a reaprender a viver.
Eu disse que me vi “só, absolutamente só”, mas preciso fazer a ressalva: o que não me faltou foi gente por perto disposta a me oferecer colo, mãos, cafuné, festinha no rosto, gente que me mostrou, de uma forma absolutamente avassaladora, a força do amor como regeneradora, revigorante e motriz para que eu seguisse em frente, ainda que moído pela mais cortante dor possível. Se me foi imprescindível, quase sempre, o estar-só (mesmo!, em estado bruto) como único meio capaz de me fazer compreender a (nova) situação, me foi reconfortante demais saber que há tanta gente querida por perto, sempre pronta para o exercício da comunhão e da arte do encontro e do convívio.
Sei que seria (e será) impossível nomear um por um, agradecer de forma explícita, escancarada, a todos aqueles que me foram, nem que por um momento, imprescindíveis e fundamentais. Faço questão, entretanto, de encarar o desafio – e por isso peço perdão, o mais sincero, se por qualquer razão eu me esquecer de alguém (o que, inevitavelmente, irá acontecer). Como eu escrevo em velocidade mediúnica, sem muito pensar e sem me preocupar com isso ou com aquilo, não vou também seguir qualquer ordem (nem a costumeira alfabética, evitando quase sempre ferir suscetibilidades) para fazer minhas citações, meus agradecimentos. Quem ditará essa ordem, como quase sempre acontece na minha vida, serão as emoções que virão à tona conforme o desenrolar do filme que foi o ano de 2011.
Agradeço, precipuamente, a meus pais, Isaac e Mariazinha, a quem também aproveito para me desculpar pelo inevitável afastamento, fruto de um sem-fim de questionamentos e de necessidades prementes que caíram, de uma hora pra outra, no meu colo. Foram, os dois, desde sempre, um pouco pais da Dani também. Mamãe a tinha como uma filha, e eu vi meu pai chorar, acho que pela primeira vez na vida, de forma intensa, na triste manhã de 10 de julho, em Volta Redonda, durante o enterro do sorriso mais bonito que o mundo jamais voltará a ver.
A meus irmãos, Fernando e Cristiano, de quem, embora também afastado por inevitabilidades da engrenagem do momento, me reaproximei pelo viés da dor. Também a Lina, minha cunhada (a quem invariavelmente me refiro como minha nora, o que diz muito do que vai em mim), dona dos mais tristes olhos que jamais vi, de quem eu sempre soube extrair a ternura que, quando necessário, me confortou.
A Sonia, mãe da Marcela e do André, e também a eles, incansáveis na arte de dar-colo. A Sonia foi, durante anos, durante o tempo da doença (como também meu pai, como também meu sogro), muitas vezes as pernas e os braços da minha menina, pra lá e pra cá com ela; a Marcelinha jamais – jamais! – me deixou sozinho (ainda cuida de mim com o zelo de uma irmã mais velha, embora mais nova que eu) e o André foi a compreensão em forma de silêncio, até que desabamos, um diante do outro, dia desses, num final de noite. Eu nunca vou me esquecer, André, daquele carinho no rosto a me enxugar as lágrimas que corriam dos meus olhos que não se cansam de chorar.
Às minhas irmãs-amadas, Betinha e Stefânia, a quem tantas vezes recorri – e que também jamais me faltaram. A Betinha (e o Flavinho!), mãe da Isabel (leiam, aqui, Nos braços de Isabel), esteve sempre que pode com minha menina, inclusive a poucas horas do nove de julho, e a Stefânia soube, com a força impressionante que carrega dentro de si (é uma das mulheres mais impactantes que já conheci), superar os quase 500 quilômetros que separam o Rio de São Paulo pra estar do nosso lado. Obrigado, amadas.
Falar em distância é lembrar da Inês, amiga querida que hoje mora em NY, que prestou comovente homenagem a Dani no dia 15 de outubro, vejam aqui. Inesquecíveis, querida, nossas conversas emocionadas através do Skype. É lembrar de seus pais, Próspero e Cidália, de Setúbal, em Portugal, sempre atenciosos conosco em busca de notícias e nos instantes em que algum conforto era imperioso. Assim como a Eduarda, irmã da Inês, também de Setúbal, sempre capaz de uma mensagem-cafuné. É lembrar da Glória, queridíssima, de Natal, RN, ela que ocupa – ela sabe, ela sabe! – um especial espaço no meu coração e na minha alma. É lembrar do Alfredo, de Manaus, AM, incansável nas demonstrações de carinho e de afeto. Obrigado, manauara, por cada uma de suas lembranças. É lembrar do Vavo, um dos mais-amados da Dani, que nunca deixou de ser explícito na exposição de sua saudade. É lembrar de meu irmão, Fernando Szegeri, o homem da barba amazônica, que detém o segredo de estar ao meu lado mesmo estando longe. Nunca me esquecerei do momento em que ele, ao lado da Railídia, minha comadre, cantou Raio de Luar pra minha menina, ao lado do caixão, poucos minutos antes do enterro. Nem da homenagem, lindíssima, que prestaram a ela, os dois (e os Inimigos do Batente), mostrada aqui, cantando o mesmo samba, que virou, pra sempre, sinônimo de Dani Sorriso Maracanã. A meu irmão Bruno Ribeiro, de Campinas, que sempre me trouxe serenidade – uma de suas mais bonitas marcas – justo quando a serenidade parecia me faltar. E à minha irmã-em-szegeri, Paula, tão doce comigo quando nos reencontramos, depois de anos, em São Paulo – percebo seus afagos do Rio, querida, vindos da tão distante Itália…
Como não agradecer, também, aos arquitetos da minha menina? A Íris, minha sogra, guerreira incansável acompanhando a filha até o último minuto, ao Wlader, meu sogro, minha mais profunda gratidão: vocês fizeram a mulher mais bonita do mundo! Aos meus cunhados Magali e Marcelo, a quem nem tenho palavras para agradecer por tudo o que representaram na vida da Dani e a quem – acho – já disse tudo o que tinha a dizer. Também ao Ricardo, marido da Magali, um soldado (ele, que também é médico, como ela) a serviço do melhor pra minha garota.
A um de meus orixás vivos, Aldir Blanc, meu amigo e meu irmão, que segurou todas as minhas petecas, todas as minhas broncas, e ele – e só ele! – sabe que não foram poucas as vezes em que a ele recorri, sendo que nunca – com a ênfase szegeriana – me foi negada a mão estendida e a palavra certa pra cada um dos momentos de sufoco. Obrigado, Aldir – do fundo do fundo do meu combalido coração, hoje tratado pelo seu cardiologista!
Vamos a mais moças, que as moças são importantes: a Leonor Macedo, meu profundo e, por tantas razões, envergonhado agradecimento, ela que me trouxe a conta certa entre a baunilha e o sal no meu tempo mais amargo. Obrigado, Lelê, por ter me dado de presente uma caixa de lápis de cor quando eu só enxergava o negro do nanquim diante de mim. E acredite: se me fosse permitido, daria a você o jardim do Aconchego Carioca como forma de lhe pedir desculpas por cada pisada de bola. Obrigado, Rosemarí, pelo pouco que houve, o suficiente para tê-la em mim em forma de lembranças, as melhores. Obrigado, Grazi, por cada abraço, por cada beijo, por cada momento – guardados em mim como um tesouro de grande valia. Obrigado, Flavinha, meu mais emocionado agradecimento pelas surpresas e pelas novidades que eu vou, vou!, incorporar à minha vida – e eu creio que lhe digo, com freqüência, o que preciso e devo lhe dizer. Até o Carnaval, Morena! Muito obrigado, Sylvia, pelos mais lindos e-mails, pelas mais cortantes mensagens, que nos irmanam por conta das palavras ditas, as mais bonitas, e que me trouxeram e me trazem sempre a obrigação de agradecer à vida por nosso encontro. Obrigado, Alessandra, a quem dediquei, em segredo, o texto É demais para o meu coração, aqui. Nunca, mesmo, me esquecerei daquele sábado enlouquecedor na quadra da Unidos de Vila Isabel – você me salvou naquela noite. Obrigado, Candinha, comadre querida (comadre!!!!!), por trazer tanta candura à minha vida e à vida da minha menina… nunca me esquecerei de cada gesto seu, de cada olhar embaçado e emocionado em minha direção… Meu muito obrigado a Olga, que também me manda e-mails tão bonitos, tão emocionados, muito obrigado, querida! A Renata (e ao Edu!), uma moça que é muito a minha cara, tão querida, tão terna, e que me ofereceu, quando mais precisei, as mais doces palavras que eu nem sei se mereci… A Flavinha, minha anã preferida, que não me negou o socorro num dos meus dias de maior sufoco. Não me esquecerei, igualmente não me esquecerei, daquela cerveja no Rio-Brasília, querida, nem que eu viva mais duzentos anos… A Juju e a Rob, presenças mais-recentes, de certa forma constantes, sorrisos que me comovem pelo que trazem de boniteza e de birita… A Sudbrack, que me emocionou de forma aguda com a homenagem que prestou à minha garota no dia que seria o dia de seus quarenta anos, vejam aqui. À minha querida Aurea, a quem compreendi mais que nunca depois do nove de julho… obrigado, querida, por cada palavra sua. E também a Ju Freitas, grata surpresa que o mundo virtual tornou real, como tantas outras gratas surpresas do mesmo gênero, que me emocionou profundamente com as flores e o cartão que me mandou no dia que seria o dia dos 40 anos da Dani… Um beijo, Ju, o mais carinhoso! E também meu agradecimento a Thaís, cunhada da Dani, mulher do Marcelo, em quem minha menina depositou tanta confiança e a quem Dani dedicou um amor que trago também dentro do peito, até hoje. Obrigado, querida, por cada presença sua. E também a Ana Paula (e ao Dan), que floriram os últimos meses da minha Dani, semanalmente, com os mais lindos cartões, presentes em todos os momentos importantes dessa caminhada tão dura… muito menos dura por conta de gente como eles. Obrigado, Ana, obrigado, Dan.
Os caras, os meus caras… Obrigado, Felipinho, irmão na mais ampla acepção da palavra, meu vizinho, companheiro de copo em diversas noites, um dos mais-mais da Dani, a quem ele – obrigado, meu irmão! – ofereceu, ao longo do tempo, diversos arranjos de diversas flores, sempre acompanhados dos mais francos cartões e dizeres, bem à sua moda. A Luiz Antonio Simas, mestre, irmão, agora meu compadre!, que foi meu parceiro incansável nas tantas e tantas noites passadas em claro no hospital, quando a você, meu compadre, eu recorri em busca do abraço e do malte. Também a esse maiúsculo, incansável, outro mano que a vida me deu, Leo Boechat, meu confessor, detentor de meus segredos, parceiro de tantos e tantos balcões da cidade, sempre disposto a me oferecer o ombro e o conforto que o dia-a-dia me negava; obrigado, meu compadre, você me foi e me é imprescindível. A Rodrigo Macedo, pelo pouco e pelo tanto. Ao Lucas, que ainda há de compreender o bem que me fez. Ao Neco, amigo de infância da minha menina, mais próximo de mim do que nunca, meu muito obrigado por cada telefonema e por cada encontro… Ao Sergio Barreto, fidelíssimo amigo da Dani, criador do Prêmio Danielli Pureza (vejam aqui), com quem bebi, ontem, no Bar Urca, numa das paisagens preferidas da minha menina, quando choramos o que não choramos desde julho juntos… Obrigado, querido, você que é responsável também pela eternidade da mais bonita mulher que o mundo jamais viu. E meu obrigado ao Alex, que depois de receber um telefonema meu em plena madrugada, acelerou meu encontro com o Sergio, eis que evitávamos, como modo de sobrevivência, nosso olho-no-olho. Meu muito obrigado, também, ao Cheval, boa surpresa desse ano que termina, um craque na injeção de ânimo, grande aquisição pro ano que chega. E ao Dudu, meu xará, um baixinho que gigante que, numa madrugada passada diante do balcão do Sat´s, em Copacabana, segurou minhas pontas quando eu parecia querer desistir.
Meus afilhados, minhas afilhadas… Especialmente ao Benjamin, filhote do Simas e da Candinha, eu que sou seu padrinho-de-rua, ele que tanto entreteve, sem saber, as últimas semanas da minha menina… Especialmente a Helena, filhota do Leo e da Renata, que quando me chama – Dudu… – me derrete. Especialmente a Milena, filhota da Mariana, ternura em forma de menina, já quase uma mulher, que me derruba sempre que me oferece as mãos e os olhos como apoio… Especialmente a Iara, filhota do Fernando e da Railídia, que quase-me-matou quando publicou sua homenagem à dinda em seu blog, aqui… Especialmente ao Henrique, meu sobrinho, meu afilhado, meu filho!!!!!, a quem sempre dei (e dou) o melhor que pude… Obrigado, moleque, por você ser quem é e por fazer parte da minha vida. E, por fim, igualmente especialmente, a Maria Helena e Ana Clara, esta última minha (nossa…) afilhada, filhas da Magali e do Ricardo, tão novinhas – 11 e 09 anos -, já apresentadas à perda, tão fundamentais para que eu prossiga em frente, e bem.
Um capítulo à parte… Quem me lê sabe que há sei-lá-quantos domingos fazemos as domingueiras no jardim do Aconchego Carioca. Meu mais profundo agradecimento a Katia e a Rosa, donas do pedaço, pelos colos, pelos papos, pelas cervejas e pelas mais gostosas comidas da cidade. Tenho dito com freqüência pra Katia que minhas semanas só foram possíveis e viáveis a partir do sustentáculo do bem-querer que as domingueiras me trouxeram. Aconchego é aquilo, e só quem ganha um abraço da Katita sabe do que estou falando… Também a Bia, a maior criação da Katita (com a licença do Guto!), meu muito obrigado, moça! Prometo manter o fornecimento de cerejas durante as manhãs dos domingos… Ao timaço que trabalha lá, Diogo (meu mais-velho!), Maurício, Otávio, Pedrão e Rafael – todos vocês foram grandes comigo, parceiros!, recebam meu muito obrigado e minha gratidão!
E por fim, ao Mello Menezes – e vou fazer breve relato pra vocês entenderem o porquê dessa especialíssima menção…
Desde nosso primeiro Carnaval juntos, no ano 2000, eu e Dani, junto com os Zampronha (André, Marcela e Sonia), organizamos o que chamamos de Feijoada da Apuração, que acontece na Mansão dos Zampronha, no Alto da Boa Vista, na Quarta-Feira de Cinzas. Para que possamos assistir juntos, torcendo, à apuração das Escolas de Samba do Rio de Janeiro, organizamos, de 2000 a 2011, o tal furdunço. Veio julho, Dani desapareceu, e a Sonia – justificadamente… – decretou o fim da feijoada.
Acontece, meus poucos mas fiéis leitores, que a Dani sempre foi pela festa, pela congregação, pela alegria, pela vida, e ela era, sobretudo, uma carnavalesca na mais ampla acepção da palavra. Não foi difícil reverter a decisão da Sonia… Vamos, pois, na Quarta-Feira de Cinzas de 2012, no dia 22 de fevereiro, organizar a Feijoada da Dani!!!!! E como a Dani tinha verdadeira adoração pelo Mello Menezes, querido nosso, e por seu traço (conheça mais sobre seus trabalhos, aqui), resolvi pedir a ele que desenhasse uma ilustração para fazermos uma camiseta para usarmos na feijoada. O Mello, então, mandou-me de presente a Dani em estado bruto… E ainda me emocionou, brutalmente, quando eu liguei pra agradecer… Disse-me ele:
– Tentei fazer a Dani o mais colorida possível, Edu, pra retratar toda aquela alegria que ela representava… Mas havia cores, Edu, que só a Dani tinha…
Absoluta verdade.
O que desejo a todos vocês que me lêem, citados ou não (tarefa impossível citar todos os que me emocionaram ao longo de 2011, como já lhes disse…), é um ano de 2012 tão colorido quanto o desenho do Mello, tão bonito e iluminado como o sorriso da minha Sorriso Maracanã, verdadeiro clarão de lua que se insinua pelos caminhos onde vou. E que possamos, tanto quanto fizemos (ao menos os meus) em 2011, ainda que sob a égide da dor, erguer muitas vezes o copo ao humor.
Até.