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– Muda o rumo da prosa já que de droga você não entende!
Como sou um poltrão, adjetivo que minha saudosa bisavó adorava!, mudo, hoje mesmo, o rumo da prosa. Vejam vocês que o 4rthur (assim mesmo, com 4 no lugar do A, como ele prefere) precisou vir a público – vejam aqui – me ensinar, por exemplo, que ecstasy e bala são a mesmíssima coisa. Confesso, também publicamente, que eu já sabia disso. Certa vez, eu e a Sorriso Maracanã estávamos em uma festa estranha com gente muito esquisita, numa casa ainda mais esquisita que os donos da festa e seus convidados juntos, a título de obrigação profissional (e mais não digo). Estava eu no bar, bebendo uma cerveja e contando os minutos, quando aproximou-se um casal de jovens imberbes. Disse-me o cara:
– E aí? Vai uma bala aí?
– Soft ou Kids?
O casal guinchava de rir diante de minha resposta, apontando os indicadores cheios de anéis mais esquisitos que eles em minha direção, até que fui salvo pela minha garota, doce como as balas da minha infância, que me explicou o merdelê todo.
Diante, então, da minha aguda ignorância, mudo o rumo da prosa.
E quero lhes contar, hoje, sobre as sandálias havaianas. E quero lhes contar sobre as sandálias havaianas como forma de expôr, de forma indelével, a podridão da massa consumista que idolatra o mercado e marcha, como uma massa de idiotas, conforme as ordens do marketing, um dos maiores responsáveis pelos males do mundo.
As sandálias havaianas são capazes de dizer mais sobre a burguesia brasileira, mais sobre a classe média brasileira, mais sobre a podre elite brasileira do que qualquer tratado sociológico. Explico.
Tinha eu 18 anos de idade – estamos em 1987 – quando ingressei na PUC para cursar Direito. Fazia parte de meu, digamos, uniforme, o par de sandálias havaianas. E se eu pudesse descrever para vocês as carinhas de reprovação de meus coleguinhas de turma que, desde o primeiro período, iam para a aula, pateticamente, de terno e gravata (mesmo sem emprego ou mesmo estágio), a cara de nojo das mocinhas que rodavam, pelos corredores da universidade, suas bolsas mais caras do que a mensalidade que papai pagava com dificuldade, vocês poderiam atestar a profunda reprovação, o intenso nojo, o intenso desprezo que aquela gente tinha pelas coisas do povo – as sandálias havaianas eram, impressionantemente, uma marca do povo.
Basta dizer que o garoto-propaganda das sandálias havaianas era o Coalhada, o personagem peladeiro, vesgo e cabeludo do Chico Anísio.
Meu apelido – pasmem!, pasmem! – passou a ser Operário, Peão-de-Obra, Pedreiro… tudo por causa das minhas sandálias havaianas.
Até que os marqueteiros decidiram, e isso não tem muito tempo, que as sandálias havaianas eram uma coisa chique, que dava status.
Foi quando, então, a canalha, que até então tinha nojo, ojeriza, verdadeiro asco da coisa, passou a usá-las, agindo, mais uma vez, como uma vara que, do chiqueiro, não dispensa o que se apresenta como pérola.
Na Europa, por exemplo, uma sandália dessas, que na Tijuca custa R$8,00 (em Ipanema não sai por menos de R$20,00), é vendida, em Londres, por quase R$500,00. Vejam aqui, no site da BBC.
Até.