Dani: talvez eu esteja cometendo aquilo que venha a ser considerado o mais insano gesto (meu, particular e íntimo, embora exposto por aí…) desde que você desapareceu (evito demais falar que você morreu, porque a palavra morte é a antítese de tudo o que você representou). Talvez meus poucos mas fiéis leitores venham a me julgar definitivamente ensandecido, vá lá. Mas é que eu fui construindo os meus dias, depois de 09 de julho, de uma forma que – é como penso – no fundo requer o que eu estou fazendo agora. Afinal, você bem sabe – quantas vezes cantei isso pra você, não foi? -, “cada um tem a própria receita pra combater a desgraça”.
Pois estive aqui, no Buteco, dias e dias a falar de nós, a falar de você, a falar de nossa história, de nossos momentos, e eu acho que é chegada a hora de fazer valer, pra valer, a hora do sossego. Sabe, garota, eu que fui, durante tantos anos, tantos anos!, um homem de absoluta fé (e minha fé é mais misturada que o sangue do brasileiro…), vi-me de uma hora pra outra, de lá pra cá, mais cético que o mais cético dos homens. Só que o ceticismo não combina comigo, assim como morte não combina com você. Eu sei que você está n´algum canto, de alguma forma, sob alguma forma, e sei que no frigir dos ovos, na crueza da vida, na dureza da verdade e no desafio que me foi posto no colo, estou sozinho – mas estou aqui.
Fui chamado a atenção, sabe? E eu sou, mais que o anti-cético, um poltrão. Não sou besta (embora tenha resistido o quanto pude) de desobedecer conselhos do invisível. É preciso que eu silencie – e você, mais do que ninguém, sabe que sou (além do anti-cético e do poltrão) um sujeito que tem a língua maior do que a boca. Mas eu ouvi: “O que está dentro da sua boca é seu escravo, saiu da sua boca é seu senhor.”. E eu não posso, e eu não quero, ser ainda mais escravizado pela palavra que, vá saber, de certa forma acaba também te escravizando.
Serve, o que estou escrevendo, é claro, também para todos os meus poucos mas fiéis leitores. Amigos nossos, amigos meus, amigos seus, gente que nunca nos viu, gente que, quase sempre, quando foi de você que falei, foi generosa comigo, foi capaz de me emocionar, foi capaz de me trazer, de certa forma, alguma espécie de alento pra enfrentar essa barra que é pesadíssima (e que acabou me levando, veja você, Tomtom!, pro divã, o mesmo para o qual tantas vezes você desejou que eu fosse…). A esses todos, também, peço licença (veja que ironia é a construção que faço!) para esse tempo de delicadeza, de silêncios, de sossego.
É preciso seguir – não é?
Pois seguirei, tendo sempre comigo a sua força – essa força magnânima, inesgotável, esse brilho quase-insuportável que é seu sorriso. Esse, Tomtom, esse permanecerá.
E por falar em sorriso, vai ser na Quarta-Feira de Cinzas a feijoada que sempre fizemos e que nesse 2012, que marca meu primeiro Carnaval sem você, será dedicada a você. Assim como sei que você viu (ou sentiu, ou vibrou-junto…) a cerimônia de entrega do prêmio que leva seu nome (que orgulho, garota…), sei que você já viu o desenho belíssimo que fez nosso Mello Menezes pra camisa que usaremos no dia 22 de fevereiro. Sei que você sabe que foi o Neco, aquele maluco, que mandou fazer as camisetas e quero que você saiba que vai ser lá, na casa daqueles três que tanto te amam, a última vez que vou – como dizer? – tornar público, eis que inevitável (a camisa já é uma declaração de amor!), tudo isso que vai em mim.
Estamos a poucas semanas do Carnaval, a festa da inversão. Pois bem. Serei o folião de sempre. Vou encarnar, me parece impossível que não seja assim, como nunca, a dupla-face da alegria e da dor, mas a dor eu vou imolar durante os quatro dias até que meus pés sangrem e minha alma se revista da alegria que vivi e que vivo por ter vivido tantos anos a seu lado. E ficamos combinados assim… Sossego. Silêncio. E delicadeza.
Sorria daí, Tomtom. Conserve aceso esse sorriso… ele é a luz que eu preciso pra meu caminho iluminar.
Meu amor pra sempre.
Até.